segunda-feira, 4 de agosto de 2014

segunda-feira, 22 de outubro de 2012

COMO PUSERAM O MEU PAÍS !!!!


Vale a pena perder 10 minutos a ler!

Pedro Marques é um jovem licenciado que emigrou para o Reino Unido para trabalhar. Como
em Portugal não existiam oportunidades nem trabalho, este jovem decidiu assim sair do país,
numa viagem apenas de ida.
No entanto este jovem achou importante escrever uma carta de despedida ao Presidente da
Republica Cavaco Silva, enviou e publicou no seu blogue a carta de despedida.

Excelência,

Não me conhece, mas eu conheço-o e, por isso, espero que não se importe que lhe dê alguns
dados biográficos. Chamo-me Pedro Miguel, tenho 22 anos, sou um recém-licenciado da
Escola Superior de Enfermagem do Porto. Nasci no dia 31 de Julho de 1990 na freguesia de
Miragaia. Cresci em Alijó com os meus avós paternos, brinquei na rua e frequentava a creche
da Vila. Outras vezes acompanhava a minha avó e o meu avô quando estes iam trabalhar para
o Meiral, um terreno de árvores de fruto, vinha (como a maioria daquela zona), entre outros.
Aprendi a dizer “bom dia”, “boa tarde”, “boa noite” quando me cruzava na rua com terceiros.
Aprendi que a vida se conquista com trabalho e dedicação. Aprendi, ou melhor dizendo, ficou
em mim a génesis da ideia de que o valor de um homem reside no poder e força das suas
convicções, no trato que dá aos seus iguais, no respeito pelo que o rodeia.
Voltei para a cidade onde continuei o meu percurso: andei numa creche em Aldoar, freguesia
do Porto e no Patronato de Santa Teresinha; frequentei a escola João de Deus durante os
primeiros 4 anos de escolaridade, o Grande Colégio Universal até ao 10º ano e a Escola
Secundária João Gonçalves Zarco nos dois anos de ensino secundário que restam. Em 2008
candidatei-me e fui aceite na Escola Superior de Enfermagem do Porto, como referi, tendo
terminado o meu curso em 2012 com a classificação de Bom. Nunca reprovei nenhum ano. No
ensino superior conclui todas as unidades curriculares sem “deixar nenhuma cadeira para trás”
como se costuma dizer.

Durante estes 20 anos em que vivi no Grande Porto, cresci em tamanho, em sabedoria e em graça.
Fui educado por uma freira, a irmã Celeste, da qual ainda me recordo de a ver tirar o véu e
ficar surpreendido por ela ter cabelo; tive professores que me ensinaram a ver o mundo (nem
todos bons, mas alguns dignos de serem apelidados de Professores, assim mesmo com P
maiúsculo); tive catequistas que, mais do que religião, me ensinaram muito sobre amizade,
amor, convivência, sobre a vida no geral; tive a minha família que me acompanhou e me fez;
tive amigos que partilharam muito, alguns segredos, algumas loucuras próprias dos anos em
flor; tive Praxe, aquilo que tanta polémica dá, não tendo uma única queixa da mesma,
discutindo Praxe várias vezes com diversos professores e outras pessoas, e posso afirmar ter
sido ela que me fez crescer muito, perceber muita coisa diferente, conviver com outras
realidades, ter tirado da minha boca para poder oferecer um lanche a um colega que não tinha que
comer nesse dia. Tudo isto me engrandeceu o espírito. E cresci, tornei-me um cidadão que, não
sendo perfeito, luto pelas coisas em que eu acredito, persigo objetivos e almejo, como todos os
demais, a felicidade, a presença de um propósito em existirmos. Sou exigente comigo mesmo,
em ser cada vez melhor, em ter um lugar no mundo, poder dizer “eu existo, eu marquei o
mundo com os meus atos”.

Pergunta agora o senhor por que razão estarei eu a contar-lhe isto. Eu respondo-lhe: quero
despedir-me de si. Em menos de 48 horas estarei a embarcar para o Reino Unido numa
viagem só de ida. É curioso, creio eu, porque a minha família (inclusive o meu pai) foi
emigrante em França (onde ainda conservo parte da minha família) e agora também eu o sou.
Os motivos são outros, claro, mas o objetivo é mesmo: trabalhar, ter dinheiro, ter um futuro.
Lamento não poder dar ao meu país o que ele me deu. Junto comigo levo mais 24 pessoas de
vários pontos do país, de várias escolas de Enfermagem. Somos dos melhores do mundo,
sabia? E não somos reconhecidos, não somos contratados, não somos respeitados. O respeito
foi uma das palavras que mais habituado cresci a ouvir. A par dessa também a
responsabilidade pelos meus atos, o assumir da consequência, boa ou má (não me considero,
volto a dizer, perfeito).

Esse assumir de uma consequência, a pro-atividade para fazer mais, o pensar, ter uma
perspetiva sobre as coisas, é algo que falta em Portugal. Considero ridículas estas últimas
semanas. Não entendo as manifestações que se fazem que não sejam pacíficas. Não sou a
favor das multidões em protesto com caras tapadas (se estão lá, deem a cara pelo que lutam),
daqueles que batem em polícias e afins. Mais, a culpa do país estar como está não é sua, nem
dos sucessivos governos rosas e laranjas com um azul à mistura: a culpa é de todos. Porquê?
Porque vivemos com uma Assembleia que pretende ser representativa, existindo, por isso,
eleições. A culpa é nossa que vos pusemos nesse pódio onde não merecem estar. Contudo o
povo cansou-se da ausência de alternativas, da austeridade, do desemprego, das taxas, dos
impostos. E pedem um novo Abril. Para quê? O Abril somos nós, a liberdade é nossa. E é essa
liberdade que nos permite sair à rua, que me permite escrever estas linhas. O que nós
precisamos é que se recorde que Abril existiu para ser o povo quem “mais ordena”. E a
precisarmos de algo, precisamos que nos seja relembrado as nossas funções, os nossos
direitos, mas, sobretudo, principalmente, com muita ênfase, os nossos deveres.
Porém, irei partir. Dia 18 de Outubro levarei um cachecol de Portugal ao pescoço e uma
bandeira na bagagem de mão. Levarei a Pátria para outra Pátria, levarei a excelência do que
todas as pessoas me deram para outro país. Mostrarei o que sou, conquistarei mais. Mas não
me esquecerei nunca do que deixei cá. Nunca. Deixo amigos, deixo a minha família. Como
posso explicar à minha sobrinha que tem um ano que eu a amo, mas que não posso estar
junto dela? Como posso justificar a minha ausência? Como posso dizer adeus aos meus avós,
aos meus tios, ao meu pai? Eles criaram, fizeram-me um Homem. Sou sem dúvida um
privilegiado. Ainda consigo ter dinheiro para emigrar, o que não é para todos. Sou educado,
tenho objetivos, tenho valores. Sou um privilegiado.

E é por isso que lhe faço um último pedido. Por favor, não crie um imposto sobre as lágrimas e
muito menos sobre a saudade. Permita-me chorar, odiar este país por minutos que sejam, por
não me permitir viver no meu país, trabalhar no meu país, envelhecer no meu país. Permita-me
sentir falta do cheiro a mar, do sol, da comida, dos campos da minha aldeia. Permita-me, sim?
E verá que nos meus olhos haverá saudade e a esperança de um dia aqui voltar, voltar à
minha terra. Voltarei com mágoa, mas sem ressentimentos, ao país que, lá bem no fundo, me
expulsou dele mesmo.

Não pretendo que me responda, sinceramente. Sei que ser político obriga a ser politicamente
correto, que me desejará boa sorte, felicidades. Prefiro ouvir isso de quem o diz com uma
lágrima no coração, com o desejo ardente de que de facto essa sorte exista no meu caminho.
Cumprimentos,

Pedro Marques

segunda-feira, 21 de maio de 2012

quarta-feira, 25 de maio de 2011

SETE FONTES: MONUMENTO NACIONAL

EIS A NOVIDADE ESPERADA HÁ MUITOS ANOS:

São classificados como monumento nacional os bens imóveis a seguir identificados:

a) A Casa do Passal, também denominada «Vila de SãoCristóvão», sita na Quinta de São Cristóvão, na freguesia de Cabanas de Viriato, concelho de Carregal do Sal e distrito de Viseu, conforme planta constante do anexo I do presente decreto, do qual faz parte integrante;
b) Os Concheiros de Muge — Moita do Sebastião, Cabeço da Amoreira e Cabeço da Arruda, na freguesia de Muge, concelho de Salvaterra de Magos e distrito de Santarém, conforme planta constante do anexo II do presente decreto, do qual faz parte integrante;
c) A Igreja do Carmo, sita na Rua da Sofia, freguesia de Santa Cruz, concelho e distrito de Coimbra, conforme planta constante do anexo III do presente decreto, do qual
faz parte integrante;
d) O Terreiro da Batalha do Ameixial, nas freguesias de Santo Estêvão, Santa Vitória e São Bento do Ameixial, concelho de Estremoz e distrito de Évora, conforme planta constante do anexo IV do presente decreto, do qual faz parte integrante;
e) O antigo Convento dos Eremitas de São Paulo da Serra de Ossa ou de Jesus Cristo (Paulistas), incluindo a cerca, sito na Calçada do Combro, freguesia de Santa Catarina, concelho e distrito de Lisboa, conforme planta constante do anexo V do presente decreto, do qual faz
parte integrante;
f) O sistema de abastecimento de águas à cidade de Braga no século XVIII, designado por «Sete Fontes de São Victor», freguesia de São Victor, concelho e distrito de Braga, conforme planta constante do anexo VI do presente decreto, do qual faz parte integrante;
g) A Casa de Chá da Boa Nova, na freguesia de Leça da Palmeira, concelho de Matosinhos e distrito do Porto, conforme planta constante do anexo VII do presente decreto, do qual faz parte integrante;
h) As Piscinas de Marés de Leça da Palmeira, na freguesia de Leça da Palmeira, concelho de Matosinhos e distrito do Porto, conforme planta constante do anexo VIII do presente decreto, do qual faz parte integrante.
Visto e aprovado em Conselho de Ministros de 3 de Março de 2011. — José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa. — Maria Gabriela da Silveira Ferreira Canavilhas.
Assinado em 14 de Abril de 2011.
Publique-se.
O Presidente da República, ANÍBAL CAVACO SILVA.
Referendado em 18 de Abril de 2011.
O Primeiro-Ministro, José Sócrates Carvalho Pinto de Sousa.
Classificação

terça-feira, 24 de maio de 2011

“IMPUSERAM, À BRUTA, UM SISTEMA DE CLASSIFICAÇÃO INQUALIFICÁVEL”



Sara R. Oliveira, Educare | 2011-05-11

Santana Castilho critica, sem rodeios, o estado da Educação no seu novo livro. A obra é lançada
amanhã e, entre muitos assuntos, aborda a perda de autoridade dos professores e revela que 27% dos pacientes dos psiquiatras são docentes.

Santana Castilho, professor de Organização e Gestão do Ensino, vai direto ao assunto. Na sua opinião, a sociedade tem vindo, gradualmente, "a perder a noção que o sistema de educação serve pessoas". As suas ideias são apresentadas no livro O Ensino Passado a Limpo - Um sistema de ensino para Portugal e para os portugueses, editado pela Porto Editora e lançado amanhã.
Uma crítica dura ao estado da educação no nosso país. "Os professores perderam o poder porque se endeusaram políticas de falsa promoção de sucesso escolar, afogando-os em burocracias sem sentido, impeditivas do cumprimento da sua missão nobre: ensinar", refere nesta entrevista, sustentando que há uma crise de autoridade na escola.
O facilitismo e a indisciplina são, na sua perspetiva, os grandes problemas do Ministério da Educação. Aponta o dedo ao fabrico de resultados estatísticos imediatos, garante que tudo falhará se se continuar a reformar por decreto e defende a autonomia das escolas e a extinção das direções regionais de educação. "A vida dos docentes está submersa por papéis, processos, reuniões e práticas administrativas sem sentido, inúteis, ineficazes e doentiamente kafkianas", avisa no seu livro. E mais: os professores portugueses trabalham, em média, mais 83 horas por ano do que os colegas da OCDE.

A síntese do que me preocupa é o próprio livro. Mas, se quiser uma síntese da síntese, dir-lhe-ei: temos, gradualmente, vindo a perder a noção que o sistema de educação serve pessoas. A educação é um direito. Refere que é um "disparate" ter os portugueses na escola até aos 18 anos e está cansado das iniciativas que garantem os direitos das minorias prevaricadoras e não das maiorias cumpridoras. Em seu entender, é preciso alterar o modelo de gestão das escolas, auditar a atividade da Parque Escolar, debater publicamente os programas escolares e recuperar os exames nacionais a todas as disciplinas. "A educação nacional foi, nos últimos seis anos, governada por snipers da portaria e do despacho, que usurparam a democraticidade e destruíram a cooperação", escreve na sua obra.
Um livro que desmonta várias situações e que aponta caminhos que podem ser escutados e integrados numa nova política educativa. O líder do PSD, Pedro Passos Coelho, assina o prefácio. "Aqui se procura, com grande pragmatismo mas sem perda de um sólido quadro de referência programática, apontar orientações e soluções suscetíveis de serem incorporadas num programa de ação política governativa", sublinha o social-democrata.
Os professores perderam o poder porque políticos demagógicos se esqueceram que o direito à educação é indissociável do dever de estudar e trabalhar, missão do aluno.

E: Refere, no seu livro, que há uma crise de autoridade na escola. Os professores perderam o "poder" que tinham? Alterar o Estatuto do Aluno poderá ser uma forma de recuperar o "respeito"?
SC: Os professores perderam o poder porque foram sistematicamente vilipendiados e apontados como responsáveis pelos erros dos políticos. Os professores perderam o poder porque se endeusaram políticas de falsa promoção de sucesso escolar, afogando-os em burocracias sem sentido, impeditivas do cumprimento da sua missão nobre: ensinar.
Os professores perderam o poder porque quiseram, mal, que eles substituíssem a respon-sabilidade primeira dos pais: fornecerem aos filhos regras de conduta civilizada, sem as quais nenhuma escola funciona, por melhores que sejam os professores. Os professores perderam o poder porque políticos demagógicos se esqueceram que o direito à educação é indissociável do dever de estudar e trabalhar, missão do aluno. Neste contexto, a alteração do Estatuto do Aluno ajudará a trazer uma nova ordem à escola. Mas é apenas um aspeto de um trabalho pesado, que pesa sobre o próximo Governo. O Estado tem vivido em licença sabática, ocupado a servir a sua corte. Há que acordá-lo para que sirva todo o país e todos os portugueses, a sua missão, afinal.
Não sou contra a avaliação, desde que seja exequível e contribua para melhorar a qualidade do sistema de ensino e a qualidade do desempenho dos professores.

E: Critica duramente o modelo de avaliação, referindo que é "tecnicamente uma nulidade e politicamente um desastre". Contra a avaliação ou a favor de um outro método avaliativo?
SC: A avaliação é uma coisa distinta da classificação. Um primeiro-ministro e uma ministra da Educação ignorantes e que odiaram os professores confundiram os dois conceitos e impuseram, à bruta, um sistema de classificação inqualificável.
Não sou contra a avaliação, desde que seja exequível e contribua para melhorar a qualidade do sistema de ensino e a qualidade do desempenho dos professores. Qualquer inteligência média compreende isto. Infelizmente, muitos políticos e comentadores não compreenderam e continuam a não compreender.

E: Sustenta que tudo falhará se se insistir em reformar por decreto e defende a autonomia das escolas. Neste sentido, qual seria o papel do Ministério da Educação?
SC: Definir as políticas, garantir a qualidade do sistema de ensino (e o que se entende por qualidade também tem de ser definido), zelar pela eficiência do sistema (porque o dinheiro dos contribuintes tem de ser bem gasto e com resultados), supervisionar e apoiar construtivamente as escolas e os professores no seu exercício profissional autónomo.

E: Avaliar as atividades da tutela é uma das medidas que propõe no seu livro. Desconfiado com a atuação do Ministério?
SC: Como em qualquer sistema, quem dirige é o primeiro interessado em ter elementos constantes que permitam corrigir rotas mal traçadas. Um Ministério da Educação não é um califado a que se deva obediência cega, ou um papado infalível. Não é uma questão de desconfiança. É uma questão de mudança de paradigma. Auscultar o que os portugueses pensam da aplicação das políticas delineadas pelo Ministério da Educação parece-me ser um belo começo para que professores, pais e alunos se sintam cada vez mais como entidade coesa.
Utopia? Talvez! Mas um grande Professor (a maiúscula é intencional), que também foi poeta, ensinou-nos, há muito, que o sonho comanda a vida.

E: Escreve que o facilitismo e a indisciplina são os problemas maiores do Ministério da Educação. Em que se refletem esses problemas?
SC: Na falta de seriedade do sistema de ensino, na ausência de condições de base para que os professores possam trabalhar e na falta de futuro dos nossos filhos e netos.
Defendo a ampla autonomia das escolas e a responsabilização plena dos seus agentes pela respetiva missão.

E: O que se ganharia com a extinção das direções regionais de educação, como sugere?
SC: O que se ganha quando se removem excrescências moles, que de nada servem a não ser complicar o normal funcionamento do sistema. Defendo, como sabe, a ampla autonomia das escolas e a responsabilização plena dos seus agentes pela respetiva missão. Neste quadro, ter uma corte de burocratas de serviço, que são meras correias de transmissão de um poder centralizado, que também combato, seria impensável. Tanto mais que consomem uma boa maquia dos impostos dos portugueses.

E: Estamos perante um sistema de ensino que não funciona? Diz que copiar modelos do estrangeiro nem sempre resulta...
SC: Não resulta nunca. Temos a nossa cultura e os nossos problemas específicos.

E: Por que razão afirma que é um "disparate" ter os portugueses na escola até aos 18 anos?
SC: Como pai, não aceito que o Estado decida por mim e pelos meus filhos a educação que eles prosseguem. Como cidadão, quero liberdade para trabalhar aos 16 anos, como, aliás, o próprio Código do Trabalho consigna. Deve o Estado garantir a todos que queiram e tenham capacidade para tal, sublinhe-se, a prossecução de estudos, sem entraves. Mas não deve o Estado impor a escola a quem já pode ser responsabilizado por crime, sabe o que faz e quer ir trabalhar. Porque, ao invés de ser compulsiva, a educação deve ser tida como um direito. Chega de Estado que diz proteger-nos de tudo menos dele próprio. Ao argumento anterior, que é teórico, acrescem outros, de natureza prática. Os nove anos de ensino obrigatório, aprovados em 1986, demoraram 10 anos a transpor para a prática efetiva. Ainda hoje não são cumpridos na íntegra.
Manter na escola, à força e à pressa, quem lá não quer estar ou não tem capacidade para prosseguir estudos, acrescentará mais violência e mais indisciplina a um ambiente que já é grave. Tal medida, a não colher o primeiro argumento, pressuporia uma preparação, que não foi feita, para receber os estimados 30.000 novos alunos. Pressuporia uma reformulação completa dos objetivos e das vias do ensino secundário, principalmente quanto ao ensino profissional que, como está, é um logro. Pressuporia a efetiva gratuitidade do ensino, que está longe de estar cumprida no quadro dos nove anos até há pouco vigentes. Se uma das causas do atual abandono, que se aproxima dos 36%, radica nesta variável, alguém de bom senso antecipa que a sociedade, com dois milhões de pobres e dois milhões de assistidos, mais de meio milhão de desempregados e magro PIB, pague para ficar com os filhos 12 anos sentados na escola? Com outros salários, com outro nível de vida, talvez. Assim, obviamente que não! E não me venham com a falácia das bolsas, que um Estado quase falido não vai poder pagar. É só olhar para a história de 2005 a 2011 para perceber que estamos nos antípodas da seriedade e no terreno do
mais rudimentar marketing político.
Ao invés de ser compulsiva, a educação deve ser tida como um direito.

E: Por outro lado, defende que as crianças só devem entrar na escola aos sete anos...
SC: Não defendo, liminarmente. Penso que seria uma boa medida, por acautelar, em termos genéricos, uma outra maturidade à entrada no ensino obrigatório. Proponho que se discuta o tema e se ouçam os especialistas.

E: O debate público dos programas escolares é, na sua opinião, um caminho para que os currículos sejam mais eficazes?
SC: Sim, mas falo de um debate público com organizações qualificadas.

E: Critica a atuação do Governo nos últimos dois mandatos, desconstrói alguns discursos de José Sócrates, coloca em causa a amostra utilizada no PISA, refere que se protege mais a minorias prevaricadoras do que as maiorias cumpridoras, revela que 27% dos pacientes dos psiquiatras são professores. O que mais o preocupa neste mundo da educação?
SC: A síntese do que me preocupa é o próprio livro. Mas, se quiser uma síntese da síntese, dir-lhe-ei: temos, gradualmente, vindo a perder a noção que o sistema de educação serve pessoas.

domingo, 15 de maio de 2011

A saúde mental dos portugueses


Nota: como estou a ficar "cota" tenho necessidade de deixar alguns pensamentos para os meus filhos e para mais os quiser aproveitar. Não há nada de novo sobre a terra. Mas há pensadores capazes de ordenar com perfeição o raciocínio e passá-lo para letra de forma. Assim outros poderão usufruir da sua organização mental. Eis um exemplo.

Transcrição do artigo do médico psiquiatra Pedro Afonso, publicado no Público, 2010-06-21

Alguns dedicam-se obsessivamente aos números e às estatísticas esquecendo que a sociedade é feita de pessoas.

Recentemente, ficámos a saber, através do primeiro estudo epidemiológico nacional de Saúde Mental, que Portugal é o país da Europa com a maior prevalência de doenças mentais na população. No último ano, um em cada cinco portugueses sofreu de uma doença psiquiátrica (23%) e quase metade (43%) já teve uma destas perturbações durante a vida.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque assisto com impotência a uma sociedade perturbada e doente em que violência, urdida nos jogos e na televisão, faz parte da ração diária das crianças e adolescentes. Neste redil de insanidade, vejo jovens infantilizados incapazes de construírem um projecto de vida, escravos dos seus insaciáveis desejos e adulados por pais que satisfazem todos os seus caprichos, expiando uma culpa muitas vezes imaginária. Na escola, estes jovens adquiriram um estatuto de semideus, pois todos terão de fazer um esforço sobrenatural para lhes imprimirem a vontade de adquirir conhecimentos, ainda que estes não o desejem. É natural que assim seja, dado que a actual sociedade os inebria de direitos, criando-lhes a ilusão absurda de que podem ser mestres de si próprios.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque, nos últimos quinze anos, o divórcio quintuplicou, alcançando 60 divórcios por cada 100 casamentos (dados de 2008). As crises conjugais são também um reflexo das crises sociais. Se não houver vínculos estáveis entre seres humanos não existe uma sociedade forte, capaz de criar empresas sólidas e fomentar a prosperidade. Enquanto o legislador se entretém maquinal mente a produzir leis que entronizam o divórcio sem culpa, deparo-me com mulheres compungidas, reféns do estado de alma dos ex-cônjuges para lhes garantirem o pagamento da miserável pensão de alimentos.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque se torna cada vez mais difícil, para quem tem filhos, conciliar o trabalho e a família.

Nas empresas, os directores insanos consideram que a presença prolongada no trabalho é sinónimo de maior compromisso e produtividade. Portanto é fácil perceber que, para quem perde cerca de três horas nas deslocações diárias entre o trabalho, a escola e a casa, seja difícil ter tempo para os filhos. Recordo o rosto de uma mãe marejada de lágrimas e com o coração dilacerado por andar tão cansada que quase se tornou impossível brincar com o seu filho de três anos.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque a taxa de desemprego em Portugal afecta mais de meio milhão de cidadãos. Tenho presenciado muitos casos de homens e mulheres que, humilhados pela falta de trabalho, se sentem rendidos e impotentes perante a maldição da pobreza. Observo as suas mãos, calejadas pelo trabalho manual, tornadas inúteis, segurando um papel encardido da Segurança Social.

Interessa-me a saúde mental dos portugueses porque é difícil aceitar que alguém sobreviva dignamente com pouco mais de 600 euros por mês,

enquanto outros, sem mérito e trabalho, se dedicam impunemente à actividade da pilhagem do erário público. Fito com assombro e complacência os olhos de revolta daqueles que estão cansados de escutar repetidamente que é necessário fazer mais sacrifícios quando já há muito foram dizimados pela praga da miséria.

Finalmente, interessa-me a saúde mental de alguns portugueses com responsabilidades governativas porque se dedicam obsessivamente aos números e às estatísticas esquecendo que a sociedade é feita de pessoas. Entretanto, com a sua displicência e inépcia, construíram um mecanismo oleado que vai inexoravelmente triturando as mentes sãs de um povo, criando condições sociais que favorecem uma decadência neuronal colectiva, multiplicando, deste modo, as doenças mentais.E hesito em prescrever antidepressivos e ansiolíticos a quem tem o estômago vazio e a cabeça cheia de promessas de uma justiça que se há-de concretizar; e luto contra o demónio do desespero, mas sinto uma inquietação culposa diante destes rostos que me visitam diariamente.

Pedro Afonso

Médico psiquiatra

sábado, 12 de março de 2011

Alice esperou 38 anos para matar o marido

por Sílvia Caneco, Publicado em 10 de Março de 2011

Aos 71 anos ficou viúva pelas próprias mãos: agarrou num tubo de ferro e matou José. Foi condenada a 14 anos, cumpriu seis. A história da luta entre a mulher e o corpo que o marido marcou com nódoas negras

Alice deita a cabeça no ombro do inspector. A cara cai-lhe ao comprido dos ossos e, pelo meio de soluços, apenas uma frase: "Não aguentei mais." O filho vai com a família a caminho de umas férias no Gerês quando o telefone toca para avisar da tragédia. "Uns homens vieram cá a casa e mataram o teu pai", diz-lhe de rajada uma vizinha da mãe. O filho não pensa e faz inversão de marcha. Estava longe de adivinhar que a tragédia afinal ainda era maior.

Alice tem 32 anos, vive em casa dos pais e quer mais é esquecer o primeiro marido e não voltar a pensar em casamento. Casou aos 18, a acreditar que seria para a vida. Foi um inferno: ele bebia, não trabalhava, jogava à batota pela noite dentro, perdia e ficava sem dinheiro. Nunca lhe bateu mas vendeu--lhe anéis, fios, pulseiras, propriedades. Um dia, aos 25, Alice desistiu: ele foi para casa dos pais dele, ela para casa dos pais dela, cheia de vergonha de regressar, adulta e falhada.

Assim se passaram sete anos, com Alice debaixo das saias dos pais a meter na cabeça que nascera sem sorte e que ali viveria para sempre, sem homem e sem chatices. Mas uns tios foram insistindo, dizendo aqui e ali como o José era um homem de boas famílias e agora também estava solteiro, depois de um primeiro casamento que falhara mas "não por culpa dele". Alice nem se lembra de aceitar. Não sorriram, não se amaram. Num dia nem era uma hipótese, no outro o casamento estava consumado. O amor era aquilo ou coisa nenhuma.

Trinta e oito anos de solidão Depois do casamento, bastaram alguns dias para adivinhar o calvário: José era, de facto, de boas famílias - seria difícil encontrar melhores sogros e cunhados -, mas não era um homem bom. "Era traçado, não de beber, que só bebia um copito de vinho à refeição. Era ruim, ruim das entranhas", conta Alice, com o mindinho torcido sobre os lábios, a retroceder dos 79 para os 32 anos.

Alice e José viviam num anexo da casa da família dele. As tareias e as ofensas eram tão violentas que nunca foram segredo para quem vivia mesmo ali ao lado. O pai tentava impedi-lo, dizendo- -lhe que as mulheres são para ser respeitadas e que Alice "era do melhor" que ele podia encontrar. A mãe, descobriu Alice anos mais tarde quando encontrou José a atirá-la para fora de uma bacia, era outra vítima. "Pega-lhe se quiseres, que eu não quero saber dela para nada", resmungava José, que rejeitava a mãe inválida com a mesma indiferença com que, por nada, rejeitava a mulher. Quando o pai de José morreu, as tareias tornaram-se quase diárias. Num dia José ameaçava atirar a cara de Alice para dentro de uma cisterna de água, noutro atirava-lhe "uma forquilha de enjeitada", noutro dava-lhe murros na cabeça porque ela gastara 3 euros na compra de um quilo de sardinhas ou tinha dado dinheiro à neta para ir comprar cebolas. Batia-lhe com as mãos, com paus, com as canadianas, com o que tivesse à mão. "Quando não batia passava a vida a judiar--me", recorda Alice, segurando as palavras com os lábios, fazendo força com os incisivos. José desprezava os pequenos-almoços, atirava louça e comida para fora da mesa ao almoço e ao jantar e enquanto fazia as suas mãos caírem sobre Alice chamava-lhe galdéria, puta, vadia, ordinária.

Ela andava de cara negra, mas escondia, esfregava as feridas com álcool. Um dia, depois de ser operada a uma mão, e antes de se deslocar ao hospital para mudar o penso, nem com álcool resultou: a solução foi encobrir as nódoas negras com pó de arroz. Transformou--se na técnica de camuflagem preferida: Alice tratava da própria caracterização. Acordava religiosamente às quatro da manhã, todos os dias, e ia para o palheiro. Ele ficava na cama, mas às sete não admitia que ela não tivesse limpado o estrume, ordenhado 32 vacas e não viesse já com um pote de leite em cada mão, pronta para tratar do pequeno-almoço e seguir para as oliveiras. Ela não parava e ele trabalhava tão pouco que, naquela aldeia de Matas, 40 habitantes e a seis quilómetros de Santarém, era conhecido como "o calão que moía a mulher com pancada".

O crime São seis da manhã do dia 2 de Agosto de 2002, sexta-feira, e, enquanto José sangra no chão da cozinha, Alice grita pelas vizinhas. Conta que apareceram dois homens, de "cara tapada com capacetes" e vestidos com "uma farda castanha", e que bateram em José até à morte para se vingarem de aventuras amorosas que ele levava em Santarém. Durante o fim-de-semana, em casa do filho, ao lado da nora e da neta, Alice anda nervosa mas mantém a versão dos factos que contou às vizinhas e à polícia. "Não conseguia contar, morria de vergonha", lembra Alice, com as unhas unidas em cacho, na cozinha de móveis melancólicos da casa do filho, onde agora vive, numa localidade vizinha de Matas.

No dia 6 de Agosto, os inspectores batem à porta de casa e pedem a Alice que conte a verdade. Não precisaram de dizer que tinham encontrado as suas roupas ensanguentadas, com sangue de José. Alice desatou a chorar, deitou a cabeça no ombro do inspector e durante minutos só conseguiu repetir: "Não aguentei mais." Era a sua confissão. Alice nunca soube distinguir se era homicida ou mártir.

António Teixeira, ex-inspector da PJ, nunca esqueceu a história de Alice. Usa--a até hoje como exemplo de que "homicidas somos todos nós, num momento de desvario e de desespero", e repete a história com a pena de quem teve de prender alguém que matou mas o fez porque foi vítima. "Porque depois de anos a ser agredida houve um dia que não aguentou mais." O ex-inspector tentou ajudar Alice. Almoçaram juntos e aconselhou-a a contar toda a história das agressões perante o juiz, naquela tarde, no Tribunal de Santarém. Alice fez tudo ao contrário. Estava tão nervosa que só continuava a repetir: "Perdoe-me, não queria matá-lo, mas não aguentei mais." Não contou das tareias e das ofensas ao longo de 38 anos, não contou que José ameaçava matá-la se ela fizesse queixa, não contou sequer que nesse dia José agarrou numa faca para lhe cortar o pescoço. Nesse mesmo dia, António Teixeira e outros inspectores levaram Alice para o Estabelecimento Prisional de Tires. Era, na altura, uma das mulheres mais velhas presas no país. Dias depois, a 19 de Agosto, a tia Alice, como ficou conhecida na cadeia, recebe um bolo na prisão, mas não conta a ninguém que faz 72 anos.

A mentira contada após o homicídio e a omissão das agressões no primeiro depoimento no tribunal foram fatais. Alice foi condenada a 14 anos de prisão. Recorreu e conseguiu dez. Pelo meio recebeu um indulto presidencial de um ano do Presidente Jorge Sampaio. Seis anos de prisão depois, no dia 6 de Agosto de 2008, entrou no carro do filho e não olhou mais para Tires.

Perder ou vencer o combate? Alice tem 71 anos e um imenso cansaço. Na noite de 1 para 2 de Agosto de 2002 nem se lembra de dormir. Não por culpa da noite abafada naquela localidade de Santarém onde o Verão quando chega queima árvores, terra, rugas e o próprio ar. Anda às voltas na cama tão cansada como se ainda andasse de cócoras, no chão, a apanhar os bocados de jantar rejeitados pelo marido. Como sempre, durante 38 anos, é a primeira a levantar-se, ainda de madrugada, e o marido fica na cama. A ronha, nessa manhã, nem durou muito. Não tardou que José, três anos mais novo, se dirigisse à casa de banho e gritasse da sanita: "Ó Maria, anda cá limpar-me o rabo."

Ela, como em tantos outros dias, foi, enrolou o papel higiénico à volta da mão e limpou-lhe o rabo. Preparava-se para fazer o pequeno-almoço quando José se antecipou e disse que tratava de si. "Ainda bem. Assim vou mais depressa para a fazenda cortar os arrebentões das oliveiras", respondeu Alice, já pronta para sair. José não consentiu aquela resposta. Agarrou numa faca da cozinha e Alice encolheu-se. Depois avançou para ela ameaçando que lhe iria cortar o pescoço. Alice soube que era ele ou ela. Procura um pau, mas não encontra. Sai do anexo e encontra um tubo - 81,3 centímetros de comprimento, 2,2 centímetros de diâmetro. E o diabo, como ela ainda hoje lhe chama, entra com ela na cozinha. O diabo eram aquelas nódoas negras na pele, o corpo calejado das tareias e das ameaças, os ecos de "limpa-me o rabo", "vou matar-te", "sua puta, galdéria, ordinária". Alice puxa a mão para trás das costas e atinge José na cabeça, deitando-o ao chão. Volta a bater-lhe com o tubo na cabeça e no corpo. Uma, duas, não se lembra quantas vezes. José sangra e morre com uma fractura no crânio. Este foi o momento em que a mulher perdeu o combate para uma barra de ferro.

O morto em casa Alice vive num anexo da casa da família do filho e não pára de repetir quanto adora filho, neta, mas desfaz-se de amores sobretudo pela nora, a mais dura da família. Anda apoiada num pau e faz força numa perna para poder mexer a outra. Os cães seguem-na do laranjal para casa, da casa para o laranjal. A aldeia que a entendeu no momento do crime agora esqueceu-a. Alice, 79 anos, nunca mais recebeu visitas dos antigos vizinhos de Matas desde que saiu da prisão. O filho, que sabe que o pai morreu às mãos da mãe, mas também o conhecia melhor que ninguém, nunca a julgou. Clara, filha do primeiro casamento de José, abriu um processo para pedir uma indemnização a Alice pelos danos causados com a morte do pai. Clara, até aos 11 anos, ia duas vezes por semana a casa do pai; daí até aos 18 ia só aos domingos para pedir a mesada; a partir daí só o viu três ou quatro vezes antes de ele morrer.

No quarto, Alice tem duas imagens de Nossa Senhora de Fátima e um postal de Natal que trouxe de Tires. A prisão, afinal, "não é assim um sítio tão fechado como pensava", diz Alice, 79 anos, nenhum traço de infância no rosto. "E até tinha colegas em situações semelhantes", como a mulher "que cortou o marido às postas". A antiga casa de Alice já não existe e na nova não há fotografias de José. "Ele quer lá saber de fotografias. Ele é ruim, de ruindade mesmo. Deus nos livre de nos calhar um desses", remata. Fala no presente como se o passado ainda existisse nele. Alice é viúva mas José ainda mora naquela casa.

(Retirada de “ionline”)

NOTA: A vida de sofrimento a que muitos humanos tão "desumanamente" estão sujeitos permite-nos afirmar a razão do velho ditado: "homo hominis lupus" (o homem transformou-se no lobo que devora o seu semelhante). Usando mal a liberdade que o Criador lhe concedeu, com essa mesma liberdade faz a diferença entre o BEM E O MAL, a montanha e o abismo, o céu e o inferno (como habitualmente são descritos).